Bundão, bundão, bundão

Eram 2h da manhã do dia 1º de janeiro de 1997, em Cabo Frio. Depois da festa da virada do ano, fui com alguns amigos saltar de um bungee jump com cerca de 70m de altura na praia, pois queria começar o ano fazendo algo diferente.

Quando chegou a nossa vez, um dos amigos, o primeiro a se colocar para saltar, entrou na plataforma e, segundo ele, no meio do trajeto, começou a tremer as pernas. Como ventava naquela madrugada, aos 70m, balançava muito e ele, diante do momento derradeiro, quando teria que saltar, não teve coragem e pediu para descer.

Enquanto descia, em coro, a galera cantava: “bundão, bundão, bundão”. Com uma coloração amarela, ele pisou sobre o chão com muita felicidade e, àquela altura, não se importava mais com a manifestação “carinhosa” dos amigos.

O próximo da fila fui eu e, ainda sob o efeito das chacotas sobre o “bundão” e rindo bastante da situação, vesti o equipamento, cheio de convicção e fui para a plataforma. Enquanto subia, ainda sorrindo, a cerca de 20m de altura, o som da galera começou a ser substituído pelo barulho do vento que vinha do mar escuro que batia em meus ouvidos. Aos 30m, não ouvia mais nada. Aos 40m, com o efeito pêndulo, já balançava bastante e já não tinha mais razões para sorrir. Aos 50m, eu percebi que a coisa era séria. Aos 60m, fiquei com muito medo. Ao chegar ao topo (70m), comecei a me questionar: “O que estou fazendo aqui? Pra que isso? O que tenho a provar para as pessoas? E se eu morro aqui?

O bungee jump não é como uma montanha russa, onde você, depois de entrar e ficar travado na cadeira, não tem mais a alternativa de voltar atrás. Neste caso, a máquina toma todas as decisões por você. Já no bungee jump, a decisão é exclusivamente sua, desde o solo até aos 70m de altura. Lá em cima, para saltar, ninguém me empurraria, mas eu é que teria que tomar a decisão de saltar, contrariando meu instinto de sobrevivência em troca de uma experiência “adrenalinizada”.

Por fim, depois de hesitar muito, saltei. Na verdade, a razão para fazê-lo não foi o meu desejo inicial de passar o ano diferente e nem de ter a experiência que desejava inicialmente. Confesso que o que me fez saltar foi o fato de não querer ouvir o coro ao descer, com a cara amarelada e dando justificativas para meus amigos. Não queria deixar esta marca justamente no início daquele ano e isso foi o que me encorajou a enfrentar o meu medo em vez de me acovardar.

Seja por um motivo pequeno, grande, ideológico, nobre ou até um motivo insignificante, é fundamental identificá-lo a fim de fortalecê-lo, porque na hora H o seu motivo pode lhe ajudar a não entrar para o time dos “bundões”. Este motivo pode ser o seu filho, sua família, seus sonhos, seus pais ou o exemplo que você representa para os seus liderados.

Na vida, haverá muitas vezes em que, depois de nos prepararmos muito e chegarmos na hora H, temeremos, mas a decisão de saltar da plataforma da vida sempre será sua e, por isso, muitos acabam criando motivos maiores para fugir, que contrariam tudo que ele acreditou enquanto se preparava. Seja para sair de casa, casar-se, ter filhos, abrir uma empresa, mudar de país ou até sair de um famigerado emprego em que você está infeliz, é preciso ter coragem.

Pode parecer muito simplista, mas pela minha experiência ao longo dos últimos 20 anos treinando executivos e empreendedores, afirmo que não é tão simplista quanto parece. Vi muita gente talentosa perdendo chances incríveis porque amarelou quando deveria agarrar a oportunidade de mudar de vida. Afinal, o destino não privilegia os covardes.