Para entender a tragédia grega

O que você faria nessa situação?

Um amigo te procura para pedir dinheiro emprestado. Os argumentos que ele usa são convincentes: está endividado e sem conseguir pagar suas contas, colocando em risco o bem estar da família (mulher e duas lindas filhas). Ele diz que está se organizando e promete te pagar em 1 ano. Segundo ele, 5 mil reais resolveriam tudo sem gerar transtornos para ninguém.

Você tem esse dinheiro disponível numa aplicação financeira, rendendo cerca de 12% ao ano e não há previsão de precisar dele. Então, sensibilizado pela situação difícil de seu amigo, você resolve emprestar o dinheiro, dando a seu amigo a responsabilidade de lhe pagar os 12% de juros ao ano. Ele concorda, pega o dinheiro, agradece e promete que no prazo acordado vai devolver o dinheiro ajustado.

Um ano mais tarde, no dia do pagamento da dívida, vocês voltam a falar no assunto. Então ele diz que as coisas não correram como ele imaginava e que acabou se endividando ainda mais no ano que passou. Você pergunta: “Mas aquele dinheiro que te emprestei não resolveria o problema?”. Ele responde: “Sim, mas aconteceram outros imprevistos e a situação se agravou ainda mais”. Lamento muito.

Por fim, ele diz que não poderá pagar a dívida como estava planejado. Você responde: “Mas, amigo, eu estou contando com esse dinheiro para fazer um investimento e preciso que você me pague”. O amigo endividado faz uma nova proposta. “Vou pagar agora os 12% de juros sobre o valor principal que você me emprestou, renovar o prazo por mais um ano e ainda proponho um novo empréstimo, dessa vez de 10 mil reais”. Segundo ele, esse dinheiro vai matar definitivamente o problema e, daqui a um ano, ele terá dinheiro para pagar os 15 mil reais de volta, mais 12% de juros.

Você fica muito desconfortável com essa situação e pensa que sua mulher vai ficar furiosa, mas resolve aceitar para ajudar seu amigo, que está muito aflito por essa situação. Não deu outra. Chegando em casa, sua mulher ficou furiosa e disse que você está sendo enganado. Você diz que não. Ele é seu amigo por muito tempo e confia nele. Seus filhos ouvem a discussão acalorada.

Um ano mais tarde, ele chega para a reunião para tratar sobre o empréstimo com uma cara de derrotado. A notícia é que a dívida dele aumentou novamente. Dessa vez ele diz que está a ponto de quebrar, o que significaria que os 15 mil + juros jamais seriam recebidos de volta. Você fica estarrecido e sua mulher diz “Eu te disse, eu te disse”, deixando todos preocupados com o grande prejuízo que seria perder o dinheiro economizado arduamente por anos. No entanto, o amigo endividado diz que enxerga uma solução para ter um final feliz: um novo empréstimo de 20 mil reais que ele promete devolver no ano seguinte + os débitos passados + juros de 12% ao ano.

Você acha essa proposta uma ousadia absurda e diz que não pode fazer isso, pois ficaria sem economias. No entanto, por outro lado, você já se considera parte do problema, já que não emprestar significaria perder tudo.

Então, você tem uma ideia e diz para ele em tom decidido: “Amigo, até agora eu lhe emprestei dinheiro e por duas vezes você não resolveu o problema. Dessa vez, para te emprestar dinheiro de novo eu quero ver suas contas e avaliar o que está acontecendo. Ele, sem alternativa, topou.

Ao mergulhar nas contas dele, você toma um susto por perceber que este amigo endividado tem uma vida mais confortável que a sua, gasta com futilidades, dá mesadas enormes para as filhas, que só andam com roupas de marca, e ainda trocou de carro duas vezes por ano em todo período. Para sustentar tudo isso, ele mentiu e pegou vários empréstimos com você.

Você fica revoltado e o considera um irresponsável e sem palavra. Tem vontade de virar as coisas, mas… perderia todo dinheiro que emprestou. Volta, engole o sapo e pergunta a ele: “Por que você fez isso?” Ele responde dizendo que não quis causar um sofrimento para sua família, que nem sabe ao certo sobre sua dívida. Então você diz a ele:

“Vou lhe emprestar esses 20 mil reais para resolver isso de uma vez por todas, com uma condição:

1. Você vai vender seus carros e comprar apenas um bem usado para se transportar até pagar toda a dívida.

2. Você vai reduzir os gastos com restaurantes que você frequenta com a família em todos os finais de semana.

3. Vai cancelar suas viagens para o exterior.

4. Por fim, vai refinanciar seu apartamento para me pagar até o final do ano.

O amigo fica muito agradecido, diz que aceita as condições, vai executar tudo o que você exigiu para o novo empréstimo e se compromete que vai pagar tudo no ano seguinte. Ele pega os 20 mil e sai satisfeito, dizendo que dessa vez vai resolver tudo.

Um mês antes do vencimento desse novo e derradeiro acordo, no ano seguinte, ele te procura dizendo que não tem como te pagar e dessa vez falando grosso. Você não esperava por isso, mas pergunta se ele realizou todas as medidas que foram acordadas. Ele disse que não fez nada. Você pergunta para ele o porquê e ele diz:

“Fiz um plebiscito com minha família e ela disse “não” para as medidas que acordamos, pois toda a família passaria muito sacrifício com os ajustes exigidos e todos consideraram inaceitáveis essas condições. Além do mais, minha mulher me disse que não acha justo, pois a família de vocês tem uma situação financeira melhor que a nossa. Logo, precisa nos ajudar. Senão, nem o que vocês nos emprestaram até agora nós poderemos pagar de volta, o que vai lhes causar grandes transtornos e prejuízos definitivos.

Você fica transtornado e, antes de falar umas verdades, ele te interrompe e diz:

“Dessa vez é pra valer, amigo. Pode me emprestar mais 30 mil reais para salvar a minha família da falência? Prometo que vou te pagar de volta…”

Bem, se você não tinha entendido a situação da Grécia até agora, essa história é bastante parecida.