Imagens dos protestos, greves e saques no Brasil se espalham por todo o mundo. Embaixadas de vários países classificam o Brasil como um lugar muito perigoso e fazem recomendações a seus cidadãos que, caso assumam o risco de viajarem ao Brasil, que tomem muito cuidado. Ler a cartilha com essas recomendações das embaixadas sobre o Brasil é ao mesmo tempo cômico e vergonhoso.
Os que tentam minimizar o problema dizem que tudo isso é uma análise sensacionalista. A razão é que eles estão tão acostumados com o caos no Brasil que nem percebem a gravidade do problema que vivem em seu dia a dia. Uma outra hipótese é que eles estejam ligados a setores do governo responsáveis pela organização do evento e que, por isso, estejam tentando minimizar os fracassos de sua gestão ao se atreverem a explicar o inexplicável.
Aeroviários ameaçam greve durante a Copa, assim como o serviço de limpeza urbana deixou o Rio de Janeiro no meio do lixo durante o Carnaval de 2014. Imagens que o mundo inteiro viu.
Não há espaço suficiente nos aeroportos para pousos e decolagens de jatos executivos, usados por empresários e autoridades que vão visitar o país durante o evento, e nem para voos comerciais adicionais que convivem rotineiramente com as incertezas do controle de tráfego aéreo.
O trânsito caótico, como já acontece nos dias normais, nos grandes centros urbanos, porém um pouco mais agravado, também será parte do dia a dia dos que viajaram ao Brasil, confiando no mínimo de planejamento do governo brasileiro que solicitou e recebeu a concessão da Fifa para sediar o maior evento do planeta.
Do outro lado da mesa está a população que, além de não ter dinheiro para comprar os ingressos dos jogos, diariamente lê as notícias escandalosas que são publicadas por todo o mundo, em vários idiomas, falando sobre a corrupção envolvendo dinheiro público nas obras dos estádios construídos em cidades que sequer terão equipes de futebol relevantes para usarem as arenas construídas a peso de ouro.
A revolta dos que vão para as ruas aumenta quando, em paralelo a todo esse cenário, observa-se a péssima qualidade dos serviços públicos, como, por exemplo, o caos nos hospitais administrados pelo SUS, a qualidade das escolas e o transporte público que trata a população como gado.
A Fifa, que perdeu a chance de tirar o evento do Brasil no ano passado – opções prontas para essa mudança não faltavam – a esta altura, arrependida por ter permanecido no país, amarga o prejuízo de imagem e vai ter que encarar o ônus de ver os brasileiros, tradicionais amantes de futebol, contra a Copa e ainda encarar os que culpam a entidade por todo o problema criado pelo governo brasileiro que não teve competência para organizar o evento e não cumpriu até o momento as promessas feitas à população sobre mobilidade urbana, como a construção de um sistema de transporte de massa operado por um trem bala, dentre outros benefícios prometidos que ficariam como legado para as cidades sede, mas que, no entanto, não saíram do campo das promessas.
No Rio de Janeiro, 45% dos entrevistados numa pesquisa realizada recentemente dizem que não vão torcer para a seleção brasileira. Há 7 anos, quando a Copa no Brasil foi anunciada, daria para acreditar nisso?
Enquanto isso, o Itaquerão, palco da abertura da Copa, que acontece daqui a apenas 20 dias, ainda não foi concluída e ainda pode ser interditada pelo Ministério Público nos próximos dias por ter operários trabalhando sem equipamentos de segurança, mesmo depois da morte de nove deles até o momento nas obras dos estádios da Copa.
Pode ser que depois que a bola comece a rolar, a festa comece e nada mais seja lembrado sobre tudo que escrevi acima. Se o Brasil for campeão, então, nem se fala. Mas quem usa um pouco mais de seus neurônios sabe que o Brasil sai com sua imagem internacional muito prejudicada deste evento e com cada um dos brasileiros mais esclarecidos tendo mais uma vez a sensação de que meteram a mão no seu bolso e levaram sua carteira.
Além disso, o mundo inteiro teve uma aula ao vivo de como não se deve organizar um evento e, principalmente, como não se deve ter a pretensão de sediar uma Copa num país com milhões que ainda vivem na miséria, sustentados por doações do governo, mas que continuam sem educação, saúde, perspectiva e o mínimo de dignidade.
Pelo visto, talvez, pela primeira vez na história desse país, a estratégia do pão e circo tenha saído pela culatra.