Rejeição e evolução: a história de como “me desistiram” de ser militar

Ao final do segundo ano do Ensino Médio, fui expulso da escola. Era uma conceituadíssima escola militar para formação de oficiais. A razão era simples: disciplina. Ou melhor, aquilo que eles chamavam de disciplina, que – dentro do conceito militar – resumia-se a jamais contrariar um “superior”, sempre responder “sim senhor ou não senhor” no último volume de sua voz, assimilar sem “rebarbar” humilhações e algumas torturas físicas, manter a barba feita e cumprir rigorosamente uma rotina diária estabelecida por alguém.

Eu me dediquei muito por 3 anos a fim de me preparar para ser aprovado nesse concurso público e ter acesso a uma vaga na carreira de oficial. Mas bastou a primeira semana convivendo com esse tipo de adestramento para eu rejeitar completamente essa metodologia que subestimava minha inteligência, violava com arrogância minha dignidade e, de forma brutal, tentava estuprar todos os dias a minha consciência.

Como tinha apenas 15 anos de idade, nutri a ilusão de que seria possível criar algum tipo de oposição, ignorando a filosofia imposta pela instituição. Ou, pior, tentando difundir uma outra filosofia. Fizeram-me o favor de me desligar, o que causou um enorme espanto e decepção em minha família e vizinhos.

Por ser tão jovem e de origem simples, saindo de casa ainda na adolescência para uma carreira tão promissora como a de oficial das Forças Armadas (apenas para contextualizar, em 1989, o Brasil ainda vivia resquícios da Ditadura Militar), criei em todos uma enorme expectativa, já que a percepção de prestígio dessa carreira segura e cheia de glamour era enorme.

De exemplo, passei a ser alvo de comentários preconceituosos. De orgulho, me tornei uma grande decepção para meus pais, que apostaram em minha preparação. Eu os compreendi perfeitamente, já que eu mesmo os envolvi nesse objetivo e, sem que eles sequer soubessem de meus conflitos vividos lá dentro da escola, foram surpreendidos com a notícia bombástica dada por telefone por um capitão de fragata, um dos oficiais da instituição, ao final do segundo ano letivo do curso.

Dentre os meus amigos de turma, a notícia soava como fúnebre, uma espécie de “presta atenção” ameaçador. Claro, ela foi utilizada como matéria prima para enquadrá-los ainda mais no formato, dentro de suas prisões ideológicas, uma espécie de vacina para prevenir que outros se atrevessem a pensar com seu próprio cérebro. Passei a ser visto como um fracassado, coitado, desprezado, inapto para o oficialato, ou seja, inapto para liderar, persona non grata, uma má influência para uma geração de futuros líderes daquela instituição.

Até certo ponto, eu concordo. Pensando com o ponto de vista deles, eu realmente era uma péssima influência, pois não me submetia a aquele adestramento e ainda representava uma influência contrária para os colegas. Aos olhos dos que precisavam manter de pé aquele teatro, eu me tornei um câncer que precisava ser extirpado.

Ainda bem que eles eram limitados, péssimos líderes e que não foram capazes de perceber que liderar é mais do que tentar “enquadrar”, “adestrar” ou “constranger”. Se fossem líderes hábeis e vocacionados, talvez tivessem tido a habilidade de me conquistar, de me motivar, e teriam me apresentado um propósito maior que me impulsionasse a me dedicar de corpo e alma àquela instituição.

25 anos mais tarde, concluo que minha saída, exatamente como aconteceu, acabou se tornando um grande combustível para eu avançar com toda garra em direção à realização de meus projetos. Por isso, fico muito feliz pela incompetência daqueles oficiais.

Essa e outras histórias de minha trajetória, eu vou contar com mais detalhes no livro que em breve será lançado pela Editora Sextante. Vou contar como reverti esse quadro, como não permiti a rejeição abalar minha autoconfiança e o desfecho que determinou o início de uma carreira de muito crescimento pessoal, profissional e, por fim, um grande crescimento empresarial no Brasil e no exterior.

Mas, pra não ficar apenas num pequeno “trailer” do livro, aproveito o clima para lhe dizer que seu valor não é determinado pelo sistema. Seu valor é você quem determina quando se atreve a sonhar sonhos grandes e tem a coragem de sair da segurança do galinheiro para voar como uma águia. Isso quase sempre significa correr alguns riscos e abrir mão de algumas pequenas coisas em que pessoas de sua idade costumam gastar tempo. Esse certamente será um de seus melhores investimentos, pois lá na frente muitos de seus “amigos” divertidos que antes lhe chamavam de bitolado ou que lhe rejeitaram vão bater em sua porta lhe pedindo um emprego.

PS: Conversei hoje com um amigo que admiro muito, um antigo colega que dividiu comigo aqueles dois anos em que participei da escola militar. Atualmente, ele é um oficial de alta patente e me garantiu que a mentalidade evoluiu muito nesses 25 anos, pois muito do que era considerado a regra, hoje, no máximo, se tornou uma rara exceção. Fiquei feliz com a notícia.