Comecei minha carreira em 1991, quando tive minhas primeiras lições de mercado ainda aos 19 anos de idade. Qual era o cenário naquela ocasião? Fernando Collor de Melo era o presidente do Brasil. Eleito em 1989, tomou posse em 1990. O Brasil vivia uma inflação louca de mais de 80% ao mês. O preço de tudo mudava duas vezes por dia e até mesmo as donas de casa precisavam agir como verdadeiras economistas para aplicarem seu dinheiro.
Para que você entenda bem o que significa uma inflação de 80% ao mês, imagine que o seu salário é de 100 reais. Ao final do mês ele se tornava algo equivalente a 20 reais, porque 80% dele foi consumido pela inflação. Para isso, existiam complexos dispositivos bancários e de indexações para que as pessoas conseguissem proteger um pedaço de seu poder de compra. Era um caos.
Na tentativa de resolver a economia, uma das primeiras decisões do governo Collor foi um pacote ousado e inesperado de confisco de dinheiro da população. O chamado Plano Collor. Todos os brasileiros tiveram a poupança confiscada, deixando apenas um pequeno valor à disposição de cada um. O valor confiscado seria, um dia, devolvido para todos. Alguns se suicidaram, outros que tinham compromissos a serem honrados quebraram e houve uma revolta generalizada. O que se esperava era que, como os ricos são a minoria, que a grande massa aprovasse as medidas. No dia 29 de dezembro de 1992, no entanto, Collor foi deposto pelo processo de impeachment. Três dias antes, no dia 26 de dezembro, com 20 anos, eu me casava com Luciana, que tinha 17 anos de idade. Estávamos decididos a iniciar a nossa vida e escrever a nossa história com as nossas própria mãos.
Nesse cenário, com o mercado sem dinheiro, desemprego alto, recessão e com inflação explodindo, foi que eu comecei minha carreira profissional. Nessa época, dizer que falar inglês um dia seria importante como sabemos hoje era uma grande novidade. Enquanto as pessoas trabalhavam para sobreviver, vender cursos de inglês requeria uma habilidade e idealismo acima da média.
Trabalhei por quatro anos nessa empresa e escalei vários cargos até ser um diretor de quatro cidades, responsável por 20 gerentes em minha divisão, ganhando 7 mil dólares por mês, com apenas 22 anos de idade. Em 1994, entrou em cena o Plano Real, que finalmente conseguiu implantar uma economia estável no Brasil. Esse cenário coincidia com minha decisão de largar aquele ganho, pedindo demissão da empresa que representou para mim o meu MBA em cenários turbulentos, para abrir meu próprio negócio. Em abril de 1995, inaugurei a primeira escola da WiseUp, que 18 anos mais tarde veio a ter quase 400 escolas em funcionamento em 6 países e que gerou mais de 10 mil empregos diretos no Brasil.
O que aprendi naquele ambiente turbulento?
1. Crise é sinônimo de oportunidades – Não gosto de crises e prefiro muito mais os ambientes estáveis. No entanto, não temos controle sobre o que acontece no país e no mundo. Logo, as crises sempre virão e se destacam os que sabem lidar com ela, ou melhor, os que sabem aproveitar as oportunidades que aparecem no meio delas. Eu costumo dizer que, em momentos de crises, o dinheiro troca de mão. Os velhos ricos sempre darão o lugar aos novos ricos que virão de baixo, os que são mais resistentes às mudanças e são mais arrojados, enquanto os velhos ricos ficam na defensiva, porque acham que têm algo a perder. Geralmente, perdem por não saírem da defesa e acabam levando uma goleada. Afinal, quem não faz leva.
2. Numa crise, é preciso ter um grau maior de idealismo – Prosperar no deserto da crise requer mais idealismo. Tecnocratas não resistem aos percalços e não encontram razão para acordar pela manhã. Mergulham na lamúria da autopiedade e se afogam no mar das lamentações. A crise é o campo de batalha perfeito para você tirar a poeira de sua espada e escudo que ficaram guardados nos momentos de bonança. Associar seu negócio a um ideal mais forte e saber envolver seu time nesse propósito fará com que você consiga navegar contra o vento e a correnteza.
3. Durante a crise é preciso mudar a mentalidade e parar de fazer comparações – O mercado muda, a economia muda, a realidade muda. Logo, é preciso compreender as mudanças, reformatar a visão e sua compreensão da realidade e olhar para a frente. Evite ficar fazendo comparações com o passado, falando da época em que o dólar custava R$ 1,56, que você viajava para o exterior todos os anos e que tudo era mais fácil. Essa época passou e, agora, quanto mais tempo você levar para compreender que a realidade mudou e, por isso, sua mentalidade e disposição também precisam mudar, menos chances terá de prosperar durante a crise e maior será a possibilidade de você aumentar as estatísticas de fracasso.
4. Na crise, o que é problema para alguns, desemprego por exemplo, pode ser uma oportunidade para você. Excelente mão de obra fica disponível em tempos assim. Pessoas que querem virar o jogo e, por isso, podem se tornar excelentes aliados para construir seu projeto ao seu lado. Em tempos de crise, as pessoas precisam se preparar. Por isso, o setor de educação é sempre uma tendência.
5. Em tempos de dólar alto, exportar seu produto ou serviço pode ser uma boa saída. A expansão internacional pode ganhar o lugar da abertura de novas filiais no país e a conquista de novos mercados em terras estranhas se tornar uma nova tendência.
6. Durante a crise, separe as estações – É muito comum em tempos de crises acontecerem manifestações e mobilizações em torno do ambiente político. Não permita que essa agenda ocupe 100% de seu foco. Faça sua parte. Mas, no dia seguinte, volte para seu trabalho, para seu projeto e concentre-se em liderar sua equipe na direção certa. Cuidado para não transformar sua equipe de trabalho num movimento social. Em casos assim, a produtividade cai mais de 50% por um erro estratégico de gestão de pessoas.
7. Afaste-se dos que aproveitam a crise para justificar o fracasso. É fato que muitos passam dificuldades numa crise. No entanto, para vencer enquanto ela durar, é preciso reposicionar sua mentalidade e seu foco, e estar atento às oportunidades, como já citei. No entanto, os que não foram capazes de fazer isso rapidamente passarão por muitas dificuldades. Alguns, em vez de aprenderem com a experiência, não se levantam mais e acabam por influenciar outros que ainda lutam por seus objetivos. Selecione bem quem vai ter a permissão de depositar informações nos seus ouvidos.
8. Durante a crise, observe quem está vencendo – Busque identificar os que surfarão as melhores ondas. Observe o que fazem, suas táticas, como abordam o mercado e a razão de seu sucesso. Aprender com maiores referenciais é sempre recomendável em qualquer cenário, em especial numa crise.
9. Não se apegue a nada. Se o seu produto ou serviço não fazem mais sentido, mude, recomece, identifique e observe a sinergia entre a atividade que você exerceu e as novas tendências a fim de otimizar os esforços e investimentos para seu novo foco.
10. Por fim, a crise é um ambiente perfeito para os mais determinados, para os destemidos, para os que não se esmorecem por conta das adversidades e desejam mudar de vida e proporcionar uma vida melhor para sua família, apesar do cenário adverso. Coitadistas e vitimistas padecem na crise e estão sempre prontos a encontrar um culpado. Numa crise, os protagonistas são os que terão história para contar e darão muitas risadas no futuro, contando para seus filhos e netos como venceram em meio ao caos.
Por fim, a crise pode acontecer na cidade, no país ou até no mundo. No entanto, você pode não sofrer os efeitos dela, ou melhor, pode até crescer durante a crise, se tiver a mentalidade certa e souber posicionar seu projeto com inteligência. A propósito, no ano de 2008, quando o mundo entrou numa grande crise financeira, foi quando minha empresa começou a crescer mais de 50% ao ano, contrariando todas as estatísticas.
Sobre crise, eu não li em um livro e nem escutei sobre isso numa cadeira da faculdade. Vivi tudo intensamente nas últimas duas décadas e com resultados positivos. Vivo hoje mais uma vez, empreendendo em diversos setores. Desejo a você todo sucesso nessa nova fase do Brasil. Não é fácil, mas é possível.
Força, GV. Quero ouvir e contar suas histórias de sucesso.
Quanto às minhas histórias, também quero continuar fazendo jus e obtendo bons resultados para poder compartilhar com você por aqui todos os dias.